terça-feira, 18 de abril de 2023

Para além do imediatismo, senso comum e conservadorismo, a Educação requer pesquisas, debates e conhecimento


 Gabriel Postigliatti*

É muito mais cômodo ficarmos no senso comum quando precisamos expor nossas opiniões a respeito de temas delicados. A situação da violência ou das violências nas escolas, e aqui me atenho às públicas, não foge disso. Claro que queremos que a escola tenha segurança, mas é necessário aprofundarmos o debate, porque de senso comum já estamos fartos. 

Por isso, precisamos buscar pesquisas, ouvir especialistas, experiências em outros países e principalmente trazer os trabalhadores da Educação para o debate, porque não é um problema só da segurança pública. A violência é crônica e de âmbito social, econômico, político, cultural que se faz nas escolas como um reflexo do que há na sociedade. 

O imediatismo nos faz pensar que colocar polícia armada ou a segurança privada dentro das unidades de ensino são ações que nos trarão segurança. Os EUA gastaram bilhões em segurança nas escolas e não conseguem resolver o problema. Estamos falando de verba pública. 

De acordo com professores que estudam e realizam pesquisa sobre o assunto nos EUA, os casos de violência aumentaram mesmo depois de ter todo tipo de vigilância e guardas armados nas escolas.

O que explica isso? Primeiro, é ter a consciência de classe entendendo que esse modelo neoliberal só traz desgraças para a classe trabalhadora. A educação brasileira vem abraçando firmemente essa ideologia e no governo Lula-Alckmin não está sendo diferente.

Há uma elite financeira, formada pelo Banco Mundial, outras famílias bilionárias e corporações que se envolvem com o  sistema de educação brasileiro adotando modelos pedagógicos que promovem o individualismo, a concepção da competição e de resultados, a falácia da meritocracia, a ilusão do empreendedorismo, o esvaziamento do conteúdo político para uma cidadania ativa e crítica, num contexto de ausência de reivindicação, jogando a responsabilidade do sucesso ou insucesso no próprio indivíduo, além de incentivar a privatização da Educação.

Os resultados dessas intervenções no cenário nacional são as piores possíveis, ou seja, um ensino com péssima qualidade, uma quantidade enorme de excluídos, vivendo em condições degradantes, além de outras séries de desmantelamentos sociais.

A partir desse raciocínio, pode-se concluir que esse modelo que estimula a competição para satisfação do mercado, do capital gera a desigualdade, a marginalização, o que pode servir de alimento para algumas violências sociais.

Esse modelo é o agraciado pelas elites hegemônicas, as classes dominantes, em detrimento a um projeto político-pedagógico que estimule formas cada vez mais coletivas de organização e conhecimento. 

É importante também ver na História que essas elites, sempre que têm a oportunidade, recorrem à extrema-direita nazifascista. A extrema-direita protege os privilégios da elite financeira, do agronegócio, da indústria, dos donos do capital em geral.

Esse pensamento vem ganhando força no Brasil nos últimos anos e também é causa das violências, visto que os jovens estão desorientados e essa mentalidade reacionária, em suas devidas proporções, tem assediado adolescentes. Como consequência, alguns casos de bullying se refletem no dia a dia das escolas.

Os grupos do submundo das redes sociais (deep web), os quais muitos jovens estão inseridos, inclusive o adolescente que esfaqueou a professora na Vila Sônia, em São Paulo, e o que praticou o atentado em Suzano, compartilham o discurso racista, xenofóbico, homofóbico.

A famigerada data de 20 de abril, escolhida para causar o pânico nas famílias e que tem provocado uma onda de ameaças e fakenews, faz referência ao ataque na Escola de Columbine nos EUA em 1999. A data é uma escolha estratégica, pois é a data de nascimento de Adolf Hitler, ditador alemão que nasceu em 20 de abril de 1889.

Isso nos diz algo, não? Diz que a ideologia neonazista, nazifascista deve ser varrida da sociedade. Infelizmente, no período de 2018 a 2022, o Brasil foi governado por um simpatizante de ideias da extrema-direita, novamente apoiado pelas elites financeiras do país. O ódio aos povos originários, às comunidades negras, quilombolas, aos homossexuais, o discurso xenofóbico esteve latente na boca do ex-presidente Bolsonaro e dos seus entusiastas.

Esse fato também deve ser aliado aos fatores das violências, não só no âmbito escolar, mas em toda a sociedade. Vi muitos compartilharem em suas redes sociais aquele texto que diz: "no meu tempo que era bom, cantávamos o hino nacional nas escolas, não tínhamos uniforme, não recebíamos bolsa família, mas tínhamos respeito…podíamos xingar o gordo de gordo, o homossexual de bicha, o negro de preto encardido...mas todo mundo se abraçava no final…" 

É deprimente porque vi até mesmo colegas professores compartilhando dessas opiniões. Diante disso, não adianta falar de cultura de paz sem tocar na questão das discriminações. Isso está enraizado na nossa vida e deve ser veementemente combatido. O passado deve servir de amparo para o que não devemos fazer mais, porque o mundo evolui. Não podemos ficar nesse conservadorismo que só segrega e que gera intolerância com a natureza da diversidade humana. 

É hora de dar luz às condições de trabalho dos trabalhadores em Educação das redes públicas, intensificar e promover a formação dos professores, para que haja práticas pedagógicas voltadas ao trabalho coletivo, à Educação de maneira integralizada (intelectual e física), que faça o estudante ser um agente vivo na sociedade.

Para isso, antes, já passou da hora de ouvir os profissionais, os estudantes, as famílias e todos os envolvidos na Educação. É necessário também ter psicólogo, assistente social à disposição não só dos estudantes, mas das próprias comunidades escolares e retirar essa sobrecarga das costas dos professores. 

Os atores da escola precisam refletir se o espaço da Educação está realmente tendo condições de proporcionar o acolhimento das crianças e adolescentes sem os trabalhadores terem que se virar nos trinta para que isso aconteça.

(*) Professor da rede pública municipal de Ensino e presidente do Simted Corumbá

 

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