Gabriel Postigliatti*
É
muito mais cômodo ficarmos no senso comum quando precisamos expor nossas
opiniões a respeito de temas delicados. A situação da violência ou das
violências nas escolas, e aqui me atenho às públicas, não foge disso. Claro que
queremos que a escola tenha segurança, mas é necessário aprofundarmos o debate,
porque de senso comum já estamos fartos.
Por
isso, precisamos buscar pesquisas, ouvir especialistas, experiências em outros
países e principalmente trazer os trabalhadores da Educação para o debate,
porque não é um problema só da segurança pública. A violência é crônica e de
âmbito social, econômico, político, cultural que se faz nas escolas como um
reflexo do que há na sociedade.
O
imediatismo nos faz pensar que colocar polícia armada ou a segurança privada
dentro das unidades de ensino são ações que nos trarão segurança. Os EUA
gastaram bilhões em segurança nas escolas e não conseguem resolver o problema.
Estamos falando de verba pública.
De
acordo com professores que estudam e realizam pesquisa sobre o assunto nos EUA,
os casos de violência aumentaram mesmo depois de ter todo tipo de vigilância e
guardas armados nas escolas.
O
que explica isso? Primeiro, é ter a consciência de classe entendendo que esse
modelo neoliberal só traz desgraças para a classe trabalhadora. A educação
brasileira vem abraçando firmemente essa ideologia e no governo Lula-Alckmin
não está sendo diferente.
Há
uma elite financeira, formada pelo Banco Mundial, outras famílias bilionárias e
corporações que se envolvem com o sistema de educação brasileiro adotando
modelos pedagógicos que promovem o individualismo, a concepção da competição e
de resultados, a falácia da meritocracia, a ilusão do empreendedorismo, o
esvaziamento do conteúdo político para uma cidadania ativa e crítica, num
contexto de ausência de reivindicação, jogando a responsabilidade do sucesso ou
insucesso no próprio indivíduo, além de incentivar a privatização da Educação.
Os
resultados dessas intervenções no cenário nacional são as piores possíveis, ou
seja, um ensino com péssima qualidade, uma quantidade enorme de excluídos,
vivendo em condições degradantes, além de outras séries de desmantelamentos
sociais.
A
partir desse raciocínio, pode-se concluir que esse modelo que estimula a
competição para satisfação do mercado, do capital gera a desigualdade, a
marginalização, o que pode servir de alimento para algumas violências sociais.
Esse
modelo é o agraciado pelas elites hegemônicas, as classes dominantes, em
detrimento a um projeto político-pedagógico que estimule formas cada vez mais
coletivas de organização e conhecimento.
É
importante também ver na História que essas elites, sempre que têm a
oportunidade, recorrem à extrema-direita nazifascista. A extrema-direita
protege os privilégios da elite financeira, do agronegócio, da indústria, dos
donos do capital em geral.
Esse
pensamento vem ganhando força no Brasil nos últimos anos e também é causa das
violências, visto que os jovens estão desorientados e essa mentalidade
reacionária, em suas devidas proporções, tem assediado adolescentes. Como
consequência, alguns casos de bullying se refletem no dia a dia das escolas.
Os
grupos do submundo das redes sociais (deep web), os quais muitos jovens estão
inseridos, inclusive o adolescente que esfaqueou a professora na Vila Sônia, em
São Paulo, e o que praticou o atentado em Suzano, compartilham o discurso
racista, xenofóbico, homofóbico.
A
famigerada data de 20 de abril, escolhida para causar o pânico nas famílias e
que tem provocado uma onda de ameaças e fakenews, faz referência ao ataque na
Escola de Columbine nos EUA em 1999. A data é uma escolha estratégica, pois é a
data de nascimento de Adolf Hitler, ditador alemão que nasceu em 20 de abril de
1889.
Isso
nos diz algo, não? Diz que a ideologia neonazista, nazifascista deve ser
varrida da sociedade. Infelizmente, no período de 2018 a 2022, o Brasil foi
governado por um simpatizante de ideias da extrema-direita, novamente apoiado
pelas elites financeiras do país. O ódio aos povos originários, às comunidades
negras, quilombolas, aos homossexuais, o discurso xenofóbico esteve latente na
boca do ex-presidente Bolsonaro e dos seus entusiastas.
Esse
fato também deve ser aliado aos fatores das violências, não só no âmbito
escolar, mas em toda a sociedade. Vi muitos compartilharem em suas redes
sociais aquele texto que diz: "no meu tempo que era bom, cantávamos o hino
nacional nas escolas, não tínhamos uniforme, não recebíamos bolsa família, mas
tínhamos respeito…podíamos xingar o gordo de gordo, o homossexual de bicha, o
negro de preto encardido...mas todo mundo se abraçava no final…"
É
deprimente porque vi até mesmo colegas professores compartilhando dessas opiniões.
Diante disso, não adianta falar de cultura de paz sem tocar na questão das
discriminações. Isso está enraizado na nossa vida e deve ser veementemente
combatido. O passado deve servir de amparo para o que não devemos fazer mais,
porque o mundo evolui. Não podemos ficar nesse conservadorismo que só segrega e
que gera intolerância com a natureza da diversidade humana.
É
hora de dar luz às condições de trabalho dos trabalhadores em Educação das
redes públicas, intensificar e promover a formação dos professores, para que
haja práticas pedagógicas voltadas ao trabalho coletivo, à Educação de maneira
integralizada (intelectual e física), que faça o estudante ser um agente vivo
na sociedade.
Para
isso, antes, já passou da hora de ouvir os profissionais, os estudantes, as
famílias e todos os envolvidos na Educação. É necessário também ter psicólogo,
assistente social à disposição não só dos estudantes, mas das próprias
comunidades escolares e retirar essa sobrecarga das costas dos
professores.
Os
atores da escola precisam refletir se o espaço da Educação está realmente tendo
condições de proporcionar o acolhimento das crianças e adolescentes sem os
trabalhadores terem que se virar nos trinta para que isso aconteça.
(*) Professor da rede pública municipal de Ensino e presidente do Simted Corumbá